Christiane Angelotti
Hoje, quero
compartilhar pensamentos sobre o amor tido como “amor romântico” ou eros — mas
sem a bobagem da idealização que muitas vezes o acompanha. Idealizar é
distorcer a realidade, é negar as pessoas em sua essência e roubar do amor a
riqueza de ser genuíno. Essa reflexão, embora focada em um tipo específico de
amor, serve para todos os seus aspectos.
Amar, para mim, nunca foi sobre possuir ou segurar. É sobre entender o outro, acompanhá-lo até onde ele pode ir — sem cobranças, sem expectativas irreais, sem idealização. Quando amamos, admiramos a pessoa pelo que ela é, e não pelo que queremos que ela seja. Amamos testemunhar seu amadurecimento, apoiá-la em seus medos e dificuldades, mas também damos espaço para que ela lide com seus traumas no seu tempo.
E, quando
chega a hora de deixar o amor partir, a primeira reação é a dor — intensa,
dilacerante. Mas logo me lembro: o amor é liberdade. Liberdade de ficar e de
desejar ir. O amor, para ser verdadeiro, não pode ser uma prisão.
Mas o que
fazemos com o amor que permanece em nós? Aquele que não vai embora mesmo quando
o outro parte, mesmo contra nossa vontade? Esse amor que transborda, nos enche
de alegria e nos impulsiona a viver? Transformamo-nos com ele. Alimentamo-nos
dele. Porque o amor não é sobre o outro — é sobre nós mesmos. É sobre o quanto
somos capazes de amar, cuidar, compreender, sentir, mudar. É enfrentar medos,
superar desafios e nos tornarmos algo maior.
Amar exige coragem. Não podemos temer o que o amor nos reserva, precisamos nos jogar nele, enfrentar os desafios que surgem no caminho e aceitar a vulnerabilidade que ele traz. Pois o amor, em sua forma mais pura, não é para os cautelosos. Ele nos desafia a sair da zona de conforto, a enfrentar os medos mais profundos, sabendo que, no fim, mesmo que o amor não dure para sempre, ele nos transforma de maneiras que não podemos prever.
O maior
presente do amor é amar.
Outro dia,
uma pessoa que amo me disse, em tom de brincadeira, que eu não ando com sorte
no amor. Mas ela se engana, e muito. Eu sou a pessoa mais afortunada que
conheço nesse tema. Já amei e fui profundamente amada.
Amei alguém
que, tomado de tanto amor por mim, me deixou seus melhores desejos para uma
vida linda pouco antes de partir desta jornada. Fui amada por doze anos por um
parceiro incrível, que partiu enquanto eu segurava sua mão. Fui amada de formas
que, às vezes, não compreendi totalmente, mas que enriqueceram minha alma para
sempre.
O que fazer
quando o amor é mais um aprendizado do que um destino? Quando, ao invés de nos
trazer felicidade ao lado de alguém, ele nos ensina que o maior ato de amor é a
despedida? Às vezes, o amor não é para durar para sempre, mas para ser vivido
intensamente enquanto está presente.
O difícil é
resistir à tentação de manter o que já não se encaixa mais em nossa história. E
isso não significa que o amor se perdeu, mas que ele evoluiu para uma forma
diferente — uma forma que, por vezes, não entendemos completamente.
Gosto de um
poema de Khalil Gibran chamado Do Amor, do livro O Profeta. Ele diz:
"Quando o amor vos chamar, segui-o,
Embora seus caminhos sejam
agrestes e escarpados;
E quando ele vos envolver com suas asas, cedei-lhe,
Embora a espada oculta na sua plumagem possa ferir-vos;
E quando ele vos falar, acreditai nele."
Esse trecho me toca, mas o poema aborda também a impermanência do amor. Amar é se entregar, mesmo sabendo que a partida pode ser inevitável.
Posso dizer
que reconheço o amor à distância, que não deixo passar despercebido. Sei
acolhê-lo quando chega e reconheço quando não deseja ficar. Porque amar é isso:
aceitar sua impermanência, deixar o outro livre para partir — e, ainda assim,
carregar o amor dentro de si como um guia, uma luz que nunca se apaga.
* Poema de Gibran narrado pela atriz Letícia Sabatella:
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